domingo, 4 de setembro de 2011

A vida atrás das grades

Foto do Filme Carandiru
No primeiro momento, toda a população carcerária evita todo e qualquer contato com pessoas desconhecidas. Insistindo e tentando uma aproximação, conseguimos aos poucos, e com muita paciência, conversar mais de perto com alguns deles.

O sentimento inicial de todos eles é muito parecido. A desconfiança é geral. A partir do momento que se deixam conhecer, verificamos que como qualquer grupo, existem semelhanças e diferenças entre eles.

O que nos deu abertura para uma conversa mais íntima, é a esperança que eles têm de ser ajudados. Quando imaginam que podem tirar algum proveito de nossa conversa, se abrem e falam até mesmo de sua intimidade.
È muito comum o sentimento de injustiça. Todos têm uma boa justificativa para estar ali. Colocam a culpa em outras pessoas, na sociedade, no governo, mas nunca assumem que cometeram algum tipo de crime.

Ressaltam sempre que foram levados a fazer aquilo. Dizem em coro que se tivessem tido oportunidades na vida, hoje não estariam ali. Não se conformam de maneira alguma com a realidade aqui de fora. A vida lá dentro é ruim. Mas ficam mais incomodados com a vida boa que algumas pessoas levam do lado de fora. É contraditório... Ao invés de lutarem por uma vida digna lá dentro, se revoltam pela vida boa que julgam poder levar aqui fora.

Outro sentimento da maioria é a preocupação com a família, apesar de nem todos a terem. Alguns se aproveitam de mães e mulheres para conseguir algum benefício. Mas, a maioria deles sente saudade de alguém... De uma mãe zelosa, de uma mulher apaixonada ou de um filho que não viu crescer. Alguns também têm vergonha. Poucos. Vergonha das mães que até hoje cuidam e defendem seus filhos. Vergonha dos filhos que já cresceram e se espelham neles.

Muitos têm medo da traição. É outro medo geral. Uns sentem medo de serem traídos pelas mulheres. Medo e vergonha de que um outro homem assuma o seu lugar lá fora. Muitos continuam sendo os chefes da família mesmo estando presos. Existe também o medo da traição lá dentro do presídio. Esta é imperdoável! É uma traição que pode lhe custar a vida. Lá dentro se dorme com um olho fechado e o outro aberto. Em determinadas situações a traição é a única saída. Muitos traem para pagar dívidas e salvar sua pele. A traição é uma bola de neve. Ela desencadeia processos de transição de poder.

O poder é algo que todos eles almejam. É muito importante mandar ou estar perto de quem manda. A hierarquia lá dentro é muito respeitada. Não a hierarquia do Estado. A lei que manda lá dentro é muito própria, criada por eles mesmos. Esta lei é muito mais respeitada por eles do que a lei aqui de fora.
Os presos, não têm medo da sanção. Roubam, matam, cometem todo tipo de delito sem medo do castigo. Sonham com a liberdade, mas não têm medo de perdê-la novamente. O arrependimento é um sentimento quase inexistente.

Escrito por: Leticia e Pablo

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